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Compra de ingressos online: veja os direitos do consumidor na fila virtual

Ao adquirir o ingresso para algum evento pela internet, é importante compreender como funciona a fila virtual e por que às vezes esgota tão rápido
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Se antes muitos brasileiros compravam ingressos de eventos em bilheterias físicas, hoje essa compra costuma ser feita de qualquer lugar, por meio de um smartphone ou de um computador. Mas se tem algo que não mudou no ambiente digital é a fila de espera.

De acordo com o levantamento “Pagamentos Móveis e Comércio Móvel no Brasil”, realizado pela Panorama Mobile Time/Opinion Box, entre agosto de 2021 e agosto de 2022, a taxa de brasileiros com smartphone que já adquiriram ingressos por meio de aplicativos subiu de 37% para 46%.

No entanto, o que era para ser algo prático acabou se tornando mais uma dor de cabeça aos consumidores. Foi o que aconteceu com vários fãs da cantora Taylor Swift, com a sua turnê “The Eras Tour” no Brasil, em 2023. Após esperarem o início da venda dos ingressos online para o público geral, muitos se depararam com o seu esgotamento em poucas horas.

O mesmo aconteceu com diversos admiradores do Coldplay, quando a banda anunciou uma temporada de shows no país em 2022 – que chegou a ser remarcada para 2023. Muitas pessoas que gostariam de ver a performance musical enfrentaram dificuldades no momento de adquirir os ingressos na internet, mesmo após aguardarem em uma fila virtual.

“Quando o site detecta um volume alto de pessoas tentando comprar ao mesmo tempo, ele organiza essas tentativas em uma espécie de fila digital, onde cada sessão do usuário recebe uma posição. O sistema reserva um espaço na fila, mas nem sempre garante que você chegará ao final do processo com ingresso disponível”, diz Gustavo Torrente, professor de Novas Tecnologias do Centro Universitário FIAP.

“Por trás disso, há servidores processando milhões de requisições simultâneas, organizando sessões, bloqueando bots e tentando entregar a melhor experiência possível – mas nem sempre isso acontece”, complementa.

  • Alta demanda: “quando um artista como Taylor Swift, por exemplo, anuncia um show, milhões de pessoas acessam o site ao mesmo tempo.”
  • Lotes e reservas: “os lotes são liberados aos poucos e parte dos ingressos já está reservada para pré-venda, parceiros e clientes de bancos específicos.”
  • Robôs automatizados: “os famosos bots simulam humanos e conseguem finalizar a compra em segundos, muitas vezes operados por cambistas.”

Quando se trata dos bots acessando as plataformas, o engenheiro eletrônico Fernando Machado complementa que esses sistemas conseguem gerar várias requisições em pouco tempo. “Além disso, se o mecanismo de bloqueio do sistema for pouco efetivo, esses robôs poderão fazer compras em grandes quantidades, antes mesmo que um humano consiga efetuar uma aquisição”, explica.

Por que quem está na fila virtual por mais tempo não fica, necessariamente, entre as primeiras pessoas a comprar os ingressos?

A fila virtual não funciona como uma fila física, diversos fatores podem afetar a posição do consumidor durante a espera pela abertura da venda do ingresso. Conforme Gustavo, isso acontece por conta de atualização da página, instabilidade do servidor ou priorização de acessos feitos por outros canais – como, por exemplo, aplicativos de parceiros.

Fernando também comenta a possibilidade de uma reordenação dos ingressos após um certo período, quando a sala de espera é liberada. Isso é feito para evitar a concorrência de robôs com humanos no procedimento de compra.

“Com isso, dentro desse intervalo de tempo, todas as solicitações passam a ter a mesma chance no processo de obtenção de ingressos. Em contrapartida, quem tiver entrado antes na sala de espera pode perder seu lugar para quem tiver entrado depois ou, até mesmo, ficar em posição além do número de ingressos disponíveis”, diz. “E, justamente, para evitar questionamentos quanto ao posicionamento original da solicitação em eventos de alta demanda, é possível que a informação da posição na fila virtual nem seja mencionada pelo vendedor”.

Fiquei muito tempo na fila e não consegui o ingresso: posso recorrer judicialmente?

Em nota publicada em julho de 2024, a Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (ABRAPE) destacou que o Produto Interno Bruto (PIB) do setor de eventos de cultura e entretenimento cresceu 2,7%. Na época, o levantamento foi baseado em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Ministério do Trabalho e Previdência.

Quando se trata da área musical, por exemplo, uma pesquisa de março de 2024 realizada pela Opinion Box e pelo Serasa mostrou que 46% dos brasileiros poupam para investir dinheiro em shows e festivais.

Considerando esse cenário, muitos podem se sentir frustrados ao passarem horas em uma fila de espera virtual e, no final, não conseguir o tão desejado ingresso para um determinado evento. Quando perguntado se o consumidor pode recorrer nesses casos, Paulo Carvajal, professor de Direito Tecnológico do Centro Universitário FIAP, diz que há, sim, essa possibilidade.

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“A longa espera em fila, sem a efetiva prestação do serviço – nesse caso, a venda do ingresso –, pode configurar uma prática abusiva por parte do fornecedor, nos termos do artigo 39, inciso V, do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Este dispositivo proíbe exigir do consumidor uma vantagem manifestamente excessiva”, explica.

Paulo acrescenta que a longa demora implica na ineficiência da organização e prestação do serviço. “Isso gera desconforto e perda de tempo injustificada ao consumidor, o que pode ser passível de reparação”, aponta. “Tais danos podem ser caracterizados com indenizações morais ou, até mesmo, o valor que os consumidores gastaram para aguardar na fila, como estacionamento, gasolina, deixar de ganhar no trabalho, entre outros”.

Professor e advogado especialista em direito digital, Lucas Karam destaca a necessidade de diferenciar “aborrecimento” com “falha na prestação de serviço”. “Em geral, os tribunais entendem que o simples fato de esperar e não conseguir comprar, embora frustrante, não gera direito a indenização, pois faz parte do risco comum em eventos muito procurados, com vagas limitadas e muitos interessados”.

Ele comenta que não há a garantia de disponibilidade ilimitada de ingressos, pois o produto tem um quantitativo restrito e pode esgotar.

“Para uma ação judicial ter fundamento, seria necessário demonstrar alguma conduta irregular ou negligente da empresa que agravou, indevidamente, a situação do consumidor. Por exemplo: se o sistema de vendas apresentou falhas técnicas graves, com quedas recorrentes, expulsando usuários da fila injustamente, ou a falta de transparência, sem uma informação correta sobre a sua posição ou a disponibilidade, gerando falsa esperança”, explica.

Ainda, o especialista cita alguns passos que podem ser tomados pelo consumidor que não conseguiu um ingresso, mesmo após ficar muito tempo na fila:

  • Registrar uma reclamação em órgãos de defesa: “ao narrar o ocorrido, a instituição pode apurar se houve falhas no sistema e pressionar a empresa a aprimorar o serviço.”
  • Fazer relatos em ouvidorias/reclamações públicas: “essa ação pode motivar a empresa a melhorar a experiência.”
  • Ação no Juizado Especial em casos de erros sérios: “se houver indícios de erro grosseiro do fornecedor, como, por exemplo, um caso em que a fila virtual liberou pessoa furando fila ou ingressos reservados que sumiram devido a bugs, o consumidor até pode tentar uma ação no Juizado Especial, munido de evidências, como prints. No entanto, é preciso estar ciente de que o resultado é incerto”.

Cambistas: existe uma lei que enquadre o cambismo como crime?

Um dos fatores que podem dificultar a compra de ingressos online no momento em que a venda inicia é a ação de cambistas. Paulo explica que essa prática existe tanto fisicamente como eletronicamente. No primeiro caso, pode haver estabelecimentos clandestinos ou pessoas que compram ingressos a mais para vendê-los.

“Para uma ação judicial ter fundamento, seria necessário demonstrar alguma conduta irregular ou negligente da empresa que agravou, indevidamente, a situação do consumidor. Por exemplo: se o sistema de vendas apresentou falhas técnicas graves, com quedas recorrentes, expulsando usuários da fila injustamente, ou a falta de transparência, sem uma informação correta sobre a sua posição ou a disponibilidade, gerando falsa esperança”, explica.

Ainda, o especialista cita alguns passos que podem ser tomados pelo consumidor que não conseguiu um ingresso, mesmo após ficar muito tempo na fila:

  • Registrar uma reclamação em órgãos de defesa: “ao narrar o ocorrido, a instituição pode apurar se houve falhas no sistema e pressionar a empresa a aprimorar o serviço.”
  • Fazer relatos em ouvidorias/reclamações públicas: “essa ação pode motivar a empresa a melhorar a experiência.”
  • Ação no Juizado Especial em casos de erros sérios: “se houver indícios de erro grosseiro do fornecedor, como, por exemplo, um caso em que a fila virtual liberou pessoa furando fila ou ingressos reservados que sumiram devido a bugs, o consumidor até pode tentar uma ação no Juizado Especial, munido de evidências, como prints. No entanto, é preciso estar ciente de que o resultado é incerto”.

Cambistas: existe uma lei que enquadre o cambismo como crime?

Um dos fatores que podem dificultar a compra de ingressos online no momento em que a venda inicia é a ação de cambistas. Paulo explica que essa prática existe tanto fisicamente como eletronicamente. No primeiro caso, pode haver estabelecimentos clandestinos ou pessoas que compram ingressos a mais para vendê-los.

“Em relação a outros tipos de evento, a revenda de ingressos por preço superior ao estampado pode ser enquadrada como prática abusiva, vedada pelo artigo 39, inciso V, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), por exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva”, diz.

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“Ou seja, em eventos ‘não esportivos’ o ‘cambismo’ não é um crime, mas um ilícito civil que é passível de indenização. No entanto, vale ressaltar que existem projetos de lei visando criminalizar o ‘cambismo’ em outros tipos de eventos”, explica Paulo.

Quais são as melhores práticas ao comprar ingressos pela internet?

Ao se preparar para comprar ingressos online, vale adotar dicas que podem evitar alguns problemas, além de auxiliar o consumidor a assegurar os seus direitos. Para isso, Lucas elenca algumas práticas para esse momento e explica cada item. Confira abaixo:

  1. Planeje-se e informe-se previamente: para eventos populares, procure saber com antecedência a data e hora de início das vendas e esteja preparado. Cadastre-se no site de vendas com antecedência (ter conta criada, cartão salvo, etc) para não perder tempo no momento crítico. Leia também as informações oficiais do evento: veja se haverá pré-venda exclusiva (por exemplo, para clientes de um banco ou membros de fã-clube), qual será o link oficial de venda, se os ingressos serão nominais, quantos ingressos cada CPF pode comprar e quais documentos serão exigidos para meia-entrada.
  2. Use equipamentos e conexões confiáveis: no horário de abrir as vendas, use uma conexão de internet estável e rápida e, se possível, acesse por um dispositivo confiável. Evite computadores públicos ou redes instáveis que possam te desconectar da fila virtual. Essas precauções técnicas diminuem as chances de travamentos durante a compra. Se o site oferecer fila virtual, mantenha a página aberta e siga as instruções (algumas filas virtuais derrubam usuários que tentam atualizar a página com frequência – fique atento às orientações na tela).
  3. Cheque a segurança do site e a autenticidade: certifique-se de estar no site oficial ou autorizado. Verifique o URL e, se necessário, acesse a página do artista ou evento e siga o link de “ingressos” fornecido por lá, para não cair em páginas falsas. Antes de inserir dados confidenciais, confirme o cadeado de segurança na barra do navegador e o certificado digital válido. Nunca forneça senhas fora do site oficial ou via telefone. Além disso, desconfie de e-mails de “promoção de ingressos” – prefira acessar manualmente o site oficial em vez de clicar em links não solicitados.
  4. Guarde registros de tudo: ao comprar, tire um print das telas principais – por exemplo, a tela que confirma seu lugar na fila, a tela de confirmação de pagamento ou qualquer mensagem de erro, se ocorrer. Após finalizar a compra, salve o comprovante (geralmente enviado por e-mail). Se o e-ticket for disponibilizado imediatamente, baixe-o e armazene em local seguro. Ter esses registros é fundamental caso algo dê errado (por exemplo, se o e-mail de confirmação não chegar, você tem a captura da confirmação no site). Também leia o e-mail recebido: confira se os dados do ingresso estão corretos (data, setor, meia ou inteira, valor cobrado). Qualquer divergência, entre em contato com o suporte da empresa.
  5. Fique atento às comunicações pós-compra: após comprar, acompanhe as notícias sobre o evento. Se o show for cancelado ou adiado, as empresas costumam enviar e-mail ou SMS, mas pode acontecer de as mensagens não chegarem (spam, por exemplo). Então, monitore as redes oficiais do artista/evento e os noticiários. No caso de qualquer alteração, proceda conforme orientado (às vezes eles mandam um link para solicitar reembolso ou um prazo para escolher entre reembolso ou manter ingresso para nova data). Não perca esses prazos.
  6. Cuidado com seus ingressos após a compra: se for ingresso digital, armazene em local seguro. Se for ingresso físico (retirado na bilheteria ou enviado), trate-o como dinheiro: não perca e não deixe ao alcance de terceiros. Em caso de perda ou roubo de ingressos físicos antes do evento, comunique imediatamente a empresa – não é garantido que emitirão a 2ª via, por receio de fraude, mas notificá-los do ocorrido e registrar um boletim de ocorrência pode ajudar a negociar uma solução excepcional.
  7. Evite pagar por “atalhos” ilegais: por exemplo, não incentive cambistas comprando ingressos superfaturados – além de ser arriscado, pode ser falso, e é uma prática ilegal que enfraquece os direitos do consumidor. Também não tente burlar sistemas de meia-entrada, como usar carteirinha de estudante falsa – isso pode causar problemas legais e prejudica o controle do benefício.
Por Proteste | Jennifer de Carvalho
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